Num pequeno vilarejo, cercado de imponentes montanhas, vivia Sofia, uma jovem de olhos irrequietos, negros como os cabelos que lhe pendiam sobre as costas. Todos a conheciam pela sua bondade, mas, acima de tudo, pelo seu espírito livre e indomável. Sempre assim fora. Desde criança que Sofia questionava o conceito de liberdade. A curiosidade era maior do que o seu corpo franzino. Mas não encontrava respostas nos olhos dos que a cercavam, que se moviam do mesmo modo que os antepassados, sem quaisquer reclamações.
- Quero ser livre! Quero fazer as minhas escolhas e seguir os meus caminhos, sem medos. Sou muito maior do que estas montanhas!
Sempre se recusou a seguir as regras rígidas e as convenções sociais do vilarejo. Passava horas a fio perdida pelos recantos da natureza que cercavam a casa ou entre os livros e os sonhos, em vez de se preocupar com tudo o que lhe acrescentava opressão e submissão.
- Antes que seja invadida por um tumor maligno que me amordace, vou partir! Vou em busca dos sonhos!
As suas palavras ressoaram estridentes no interior da casa, como se uma ventania tivesse trespassado as paredes e o silêncio que se seguiu entoou como se tivesse parado o tempo. Sobre o rosto da mãe penderam lágrimas mudas e nesse instante fechou os olhos com leveza. Longe ia o tempo em que nas suas asas abrigava Sofia e por ela tomava as decisões. De repente, sentiu que os seus ossos pareciam quebrar perante o impacto daquelas palavras e ressentiu a solidão dos dias que se seguiriam sem a presença de Sofia, das suas gargalhadas, dos sonhos que voavam nas nuvens, da sua inspiração. Nunca ousara ser assim, remando contra tudo e contra todos, sacudindo o medo para lá das montanhas.
- Vou encontrar-me, mas hei de voltar! Um dia venho buscar-te para te mostrar o mundo com outros olhos.
Sob a luz da lua cheia saiu silenciosamente, sem pieguices. Era mais simples assim. Com o coração acelerado e o peito a transbordar de esperança, seguiu pelas estradas empoeiradas em direção ao desconhecido. Seguiu sem destino certo, apenas com o desejo ardente de explorar e encontrar a sua essência. O tempo seguiu o seu rumo. Os dias amanheceram desafios e adormeceram sob a bruma dos perigos que espreitavam. Aprendeu a confiar na sua intuição e nos sonhos que moravam em si.
À medida que o sol repousava e as estrelas mais altas brilhavam, sob o olhar permanente do tempo, Sofia foi encontrando o sentido da liberdade e aí percebeu que ela ultrapassava a simples escolha do caminho. Sentia-se livre pela coragem de ser quem era, sem medo de julgamentos ou reprovações. A liberdade que procurava estivera dentro dela o tempo todo. Prometeu a si mesma jamais permitir que a aprisionassem pelas correntes dos olhos dos outros e, assim, com a alma feliz, soube que a liberdade era apenas mais uma aventura que iria despontar em cada amanhecer, mesmo entre as montanhas do vilarejo.
Nota: Conto breve original, criado no âmbito do desafio lançado nas redes sociais pela escritora Maria Teresa Oliveira Portal. Todos os direitos reservados.
Elisabete Brito
Uma casa na Lua
Olá, convido-te para a minha Casa na Lua!
Elisabete Brito é doutorada em Sociologia, Mestre em Educação e Bibliotecas e licenciada em Literaturas Modernas. Na escrita mora a sua forma de ser, de ler e de estar, entranhada em tudo o que faz. Com as palavras pinta o mundo, costura os sentidos, reinventa os dias e, acima de tudo, brinca. Gosta dos abraços do mar, do charme das flores e dos segredos que guardam as noites estreladas, de andar com a cabeça nas nuvens e dos mistérios cheios de poesia.
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