Já ouviste dizer, certamente, que há pessoas que devoram livros, outras que os saboreiam ou que se deliciam com a leitura. Estas são algumas das analogias que se estabelecem entre ler e comer. O mote para esta reflexão é o dia mundial da alimentação, celebrado a 16 de outubro.
Todos sabemos que quanto mais saudável forem os alimentos que ingerimos, mais fortes e sadios nos sentimos. Tantas vezes transmitimos essa ideia aos mais novos quando se recusam a comer fruta ou legumes. O mesmo se aplica aos livros. Num sentido metafórico, quantos mais livros tragamos, mais fortes e sábios nos tornamos. A leitura inspira o pensamento, a ação e a forma como falamos. Por isso é essencial fazer boas escolhas.
Umas vezes degustamos as palavras iniciais, outras apaixonamo-nos pela capa, outras ainda pelo que nos conta a contracapa ou simplesmente somos sugamos pelo livro sem saber muito bem porquê. Já ouviste certamente a expressão: Os olhos também comem. A visão aplica-se na alimentação, mas também nas leituras que selecionas. As primeiras impressões estão no olhar, naquilo que vês e, consequentemente, imaginas.
Muitas vezes, quando nos sugerem um livro, arriscamos experimentar um sabor diferente, apesar de a prática de leitura ser muito pessoal, fruto das experiências de cada um. Temos esta liberdade de seguir os passos da nossa curiosidade e abrir as portas apenas àqueles que queremos.
Jamais encontramos dois sabores iguais e o nosso não será, certamente, idêntico ao do nosso melhor amigo, ainda que o livro seja comum. Mas é fundamental que ocorra num determinado momento um encontro crucial com o livro, com um determinado género, tema, personagem, estilo, de modo a que aconteça uma envolvência e uma projeção do leitor nessa leitura porque gostar de ler não é um dom inato. O facto de sabermos ler, através das leituras que fazemos do mundo (nas bulas dos medicamentos, nos supermercados, na publicidade…) não significa que gostemos ou que isso se transponha para uma leitura literária.
Necessita, naturalmente, de ser também ele alimentado, para que nos permita usufruir de uma outra vertente, a do deleite. Tudo isto porque ler é despertar, é entrar em cada uma das páginas do livro e descobrir o que se esconde entre elas, muito para lá das palavras que saboreamos. Essas são o mais imediato. Paulatinamente vem tudo o que elas guardam e os nossos sentidos reagem a essa leitura. Por isso, rimos ou choramos tantas vezes.
Há leituras mais rápidas, leituras mais lentas. O sabor que nos fica no final de cada refeição de leitura depende também disso. Há livros que nos prendem e estendemos o tempo para que não chegue à última página, mas também são alguns dos que nos prendem que, apesar de os querermos delongar, devoramos com avidez. Outros ainda lemos de pernas para o ar, do fim para o princípio.
Independentemente do ritmo, a leitura permitir-te-á reduzir o stress e acrescentar-te bem-estar emocional, além de muitos outros benefícios de que já te falei. Naturalmente não deves estabelecer metas irrealistas que não possas cumprir.
Tal como não fazes diariamente refeições avantajadas porque as indisposições são inevitáveis, também à leitura podes dedicar apenas um tempo determinado por ti. O mais importante é estabelecer uma rotina consistente. Acima de tudo, fá-lo por prazer, para nutrires e fortaleceres o teu espírito e a tua alma porque, de acordo com a ideia de Jordi Fabra, a pessoa que não lê está morta ainda que continue a respirar, ausente e manca, sem referências.
Já que falamos de alimentação, por que não fazermos um piquenique? Coloco na cesta alguns alimentos essenciais para alimentarmos o espírito e a imaginação: o Nabo Gigante de Alexis Tolstoi (Livro Horizonte), Come a sopa, Marta! de Marta Torrão (O bichinho do conto), A galinha ruiva de Leo Timmers (Dom Quixote), A Rita e a floresta dos legumes de Rita Redshoes e Narciso Moreira (Betweien Edições). Acrescento ainda A que sabe a lua? de Michael Grejniec (Kalandraka)? A uva amarga de Jory John (Alma dos Livros) e Os Rinocerontes não comem panquecas de Anna Kemp (Civilização Editora). Também tu podes sugerir outros alimentos.
Cada uma das sugestões que mencionei anteriormente contém muito mais do que o degustar ou os alimentos que os títulos nos sugerem. Alguns trazem-nos, além deste saborear, a fragrância que nos aconchega os sentidos.
O olfato tem um papel primordial na componente alimentar porque exerce influência sobre a nossa capacidade de apreciar os alimentos através do aroma. Sem ele estamos limitados ao salgado, doce, amargo e ácido. Quem não conhece os livros que nos conduzem do olfato para o paladar, de Alice Vieira (Livro com cheiro a canela, a chocolate, a morango a caramelo, a banana, a baunilha)?
O que realmente importa é ler e nutrir o corpo e a alma, para as maleitas dos dias mais frios, e durante esse período reinventa-se o tempo para criar cumplicidades e distintas experiências sensoriais.
Agora é a tua vez. Quais os nutrientes que vai selecionar?
Elisabete Brito
Uma casa na Lua
Olá, convido-te para a minha Casa na Lua!
Elisabete Brito é doutorada em Sociologia, Mestre em Educação e Bibliotecas e licenciada em Literaturas Modernas. Na escrita mora a sua forma de ser, de ler e de estar, entranhada em tudo o que faz. Com as palavras pinta o mundo, costura os sentidos, reinventa os dias e, acima de tudo, brinca. Gosta dos abraços do mar, do charme das flores e dos segredos que guardam as noites estreladas, de andar com a cabeça nas nuvens e dos mistérios cheios de poesia.
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