Comecei a dar voz a este sonho com a poesia e foi também na poesia que lancei o primeiro livro. Como foi interessante e enriquecedora a partilha de experiências e de vozes em torno da poesia. Partilhei-a com os mais novos e com os mais crescidos. Ela tem esta capacidade extraordinária de unir as pessoas à sua volta, afinal ela é de todos e para todos que a quiserem abraçar. A verdade é que ainda que haja palavras que as crianças desconhecem, há muitas outras que fazem parte da sua aprendizagem. As desconhecidas ficam guardadas para o futuro que há de chegar. Não entender tudo faz parte do seu quotidiano.
Não obstante, apesar de o primeiro livro publicado ser de poesia, o desafio maior é, desde há uns anos, o da literatura para os mais novos. Na verdade, “A interminável casa das histórias” começou a ser escrita antes da “Antologia para os sentidos”. Foi um processo muito mais longo, de escrita e reescrita, reflexão. Depois ficou guardado, sem pressas. Entrementes, fui escrevendo poesia e contos para adultos. O bichinho continuou lá.
Muito antes de enveredar pela escrita de forma mais concreta, já a literatura para os mais novos despertava em mim uma multitude de sentidos. Com o tempo fui aprendendo a saboreá-la. Isso não lhe diminuiu a exigência. Aliás, durante muito tempo teve outro efeito, aumentando em mim essa instância. Escrever para crianças não se coaduna com o tamanho dos leitores.
Considero ainda que estes pequenos leitores são muito mais exigentes porque dentro deles coabitam os sonhos e a imaginação, enquanto muitos adultos foram invadidos pelas sombras das rotinas e pelos filtros da racionalidade. Deve escrever-se para os mais novos com o mesmo respeito com que se escreve para os adultos. As crianças têm sentido crítico e também sabem daquilo que gostam (ainda que muitos adultos não relevem tantas e tantas vezes).
Enquanto leitora digo-vos que há livros infantis intemporais, sem idade para serem apreciados. Tal como disse C.S. Lewis, uma história infantil que só pode ser apreciada por crianças não é uma boa história infantil. Assim, se o adulto se emociona, o que acontecerá com a criança? Emoção e fruição são palavras fundamentais. Despertar emoção num momento de fruição das crianças através da leitura não é assim tão simples. Elas são exigentes e quando gostam a leitura repete-se vezes sem conta. A leitura por fruição não tem como objetivo ensinar, mas seduzir. Esta sedução aplica-se a crianças e adultos, independentemente do tema, sem tabus porque as histórias fluem como a vida. É precisamente essa capacidade de seduzir que nem sempre se consegue. Para mim é fundamental que exista naquilo que escrevo, sem idade.
Dois universos passíveis de conciliação. Não obstante há instantes em que ambos permanecem dentro de mim e partilham lugares comuns. Nem sempre é simples separá-los, muitas vezes se imiscuem entre a poesia e a prosa. Partilho notas nos meus cadernos para que não me percam. Por vezes, fogem velozes, mas logo a seguir outras chegam. Em ambos os universos, as palavras permitem que o mundo tenha ordem. As palavras são bálsamo que fortalece a sensação de bem-estar.
Escrever para crianças é o lugar onde quero estar, o que não significa que não continue a escrever para adultos. Na verdade, ser mãe transformou-me enquanto pessoa e enquanto escritora porque me fez sentir com mais intensidade o mundo dos mais novos e trouxe uma vontade maior de explorá-lo.
Deixo-vos com as palavras de José Saramago, para que cada um olhe para dentro de si e encontre as respostas para estas questões. Querem partilhá-las comigo?
E se as histórias para crianças passassem a ser de leitura obrigatória para os adultos?
Seriam eles capazes de aprender realmente o que há tanto tempo têm andado a ensinar?
Elisabete Brito
Uma casa na lua
Olá, convido-te para a minha Casa na Lua!
Elisabete Brito é doutorada em Sociologia, Mestre em Educação e Bibliotecas e licenciada em Literaturas Modernas. Na escrita mora a sua forma de ser, de ler e de estar, entranhada em tudo o que faz. Com as palavras pinta o mundo, costura os sentidos, reinventa os dias e, acima de tudo, brinca. Gosta dos abraços do mar, do charme das flores e dos segredos que guardam as noites estreladas, de andar com a cabeça nas nuvens e dos mistérios cheios de poesia.
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