Outras leituras do mundo pela leitura das palavras

Vidas sofridas são muitas as que por aí grassam, mas também as que moram num romance com o mesmo nome. Falo-te, neste caso, do primeiro romance de Maria Teresa Portal Oliveira. Já aqui te falei sobre o segundo romance da autora, ambos sob a chancela da Busílis.


O título sugere-nos a abordagem de temáticas, desde logo, difíceis diante do termo “sofridas”, carregando em si o peso da palavra que, num primeiro impacto, nos remete para vidas desgraçadas, árduas, submissas.


São 200 páginas que inquietam. O romance começa com a descrição dos dois conventos franciscanos, um de cada lado do rio tumultuoso, monumentos nacionais, albergam a escolarização obrigatória até ao 12.º ano: o da Imaculada Conceição, as raparigas e o pré-escolar, e o de S. Salvador, os rapazes.


Um início pacífico. Mas à medida que avançamos vai-nos deixando sem fôlego por esta sucessão de vidas. O que vemos diante de nós é uma sequência de vidas e situações que circulam neste espaço e neste tempo muito particular. Sim, são tantas vidas reais que conhecemos, que ignoramos, que nos entram em casa pelos telejornais ou que vivem ao nosso lado, muito semelhantes às que circulam por estas páginas.

Caminhei em cada página por caminhos de sofrimento de gente como eu e como tu, com quem nos cruzamos sem sabermos, em silêncio. Revolveram-se-me as entranhas diante de muitas imagens que as palavras me trouxeram, mas também sorri diante de algumas das personagens pela luz que nos trazem e com ela alguma esperança. Na verdade, não são seres perfeitos, mas humanos e subordinadas às leis físicas e químicas da vida. (Jordi Fabra)

Uma tempestade aterradora marca a totalidade do romance. Ao longo desse tempo tudo acontece, perpassando pelos maus tratos, a violência doméstica, a pedofilia, a homossexualidade, homicídios involuntários, a resignação, as vidas miseráveis, a violação, vidas passadas, um querer mudar e mudanças efetivas. Estas são questões sociais que não se ultrapassam escondendo. Precisam de ser faladas, debatidas, construindo e desconstruindo estas realidades. Mais uma vez, a literatura a provocar, a incomodar e a desafiar.


Um livro para leres. Só assim conseguirás sentir em ti este misto de emoções. Um romance arrebatador que nos prende até à última página, cheio de segredos arrepiantes entre as paredes destes dois conventos.


Ao longo destas páginas irás perceber que nelas não mora apenas a coragem da autora pelo uso das palavras cheias de humanidade, embora cruéis tantas vezes, mas pelo facto de não ter pejo ao longo do romance em derrubar barreiras contra um sistema sem sentido. Na verdade, irás deparar-te com algo que te é familiar, a capacidade excecional de resiliência por parte de algumas das personagens (tal como na vida), que as conduz a novos caminhos, e a resignação de outras.


Lembra-te de que cada personagem nos faz sentir aquilo que não vemos e com ela nos vamos moldando. Talvez esta seja a impressão digital que cada novo livro/ nova leitura deixa em nós. Por isso, o caminho a partir daqui é teu. Lê e sente à tua maneira! Boas leituras!



Elisabete Brito


Uma casa na Lua

Olá, convido-te para a minha Casa na Lua!

Elisabete Brito é doutorada em Sociologia, Mestre em Educação e Bibliotecas e licenciada em Literaturas Modernas. Na escrita mora a sua forma de ser, de ler e de estar, entranhada em tudo o que faz. Com as palavras pinta o mundo, costura os sentidos, reinventa os dias e, acima de tudo, brinca. Gosta dos abraços do mar, do charme das flores e dos segredos que guardam as noites estreladas, de andar com a cabeça nas nuvens e dos mistérios cheios de poesia.

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